A Gazeta de Vargem Grande do dia 16 de fevereiro veiculou uma reportagem com o infectologista Marcelo Luiz Galotti Pereira, que atende no município, explicando sobre a doença. Na ocasião, ainda havia apenas a hipótese da Covid-19 chegar ao país e, no mundo, havia cerca de 60 mil pessoas infectadas e 1,3 mil mortes. Nesta semana, a doença registrou 16 pacientes em Vargem. Em todo mundo, são mais de 5 milhões de infectados e no Brasil, mais de 20 mil mortos.
Segundo o especialista, essa evolução rápida de casos era esperada uma vez que o coronavírus, apesar de ser um agente de baixa patogenicidade – ou seja, para cada 100 pessoas contaminadas, 83% nem percebem que tiveram – é de alta transmissão. Dr. Marcelo explicou dos outros 17%, uma boa parte desenvolve sintomas, mas se recupera sem maiores problemas e aproximadamente um terço deles se agrava, precisando de internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
“Se você comparar o coronavírus e os vírus Sars e Mers, vê que um matava 10% e o outro matava 30%, enquanto o coronavírus mata de 2% a 3%, o que se acredita com números aproximados”, explicou. No entanto, o grande problema é a alta transmissibilidade. Segundo o médico, cada pessoa contaminada passa até para outras seis. Assim, o que em valor relativo seria pouco, como 2% ou 3%, em número absoluto passa a ser muito grande.
No interior
De acordo com o especialista, já era esperado que os casos demorassem mais para chegar nas cidades do interior. “Isso porque são cidades com escolaridade boa, nível socioeconômico razoável, são horizontais, ou seja, não tem muitos prédios e são quentes. Tudo isso leva à expectativa que não vai assumir a intensidade, por exemplo, da cidade de São Paulo e Rio de Janeiro, onde você tem Rocinha, Heliópolis e Paraisópolis”, disse.
Sobre Vargem, o médico falou que a as medidas de prevenção evoluíram do início da eidemia até recentemente. “No início, vi uma fila imensa nas lotéricas e ninguém com máscara. Entrei em depressão. Hoje, você vê todos com máscara, já tem regras bem estabelecidas no comércio, quem abre e quem não abre e como abre”, disse.
O médico pontuou que tudo isso faz com que a evolução da epidemia no interior aconteça de uma forma mais lenta, que é o almejado, pois se há um número elevado de casos em Vargem, o Hospital de Caridade não teria equipamentos para todos.
Contenção
Ele explicou que um dos segredos para conter a mortalidade da doença, é conseguir segurar a velocidade da epidemia para que ela não aconteça de forma exponencial, para que o Hospital e demais órgãos da Saúde consigam lidar com a situação, além de proteger os idosos, porque a mortalidade é altíssima nesse grupo.
Evolução
Segundo o especialista, é fato que as medidas de preparação e prevenção ajudam a atrasar o pico da doença e diminuir os casos confirmados. O médico comentou que isso também ocorreu em São Paulo, uma vez que há cálculos que mostraram que as medidas adotadas, diminuíram 25 mil mortes no período. Ele ponderou que nas cidades do interior, as etapas de evolução do número de casos acontecem depois da Capital. De acordo com o médico, ainda não se chegou ao pico da pandemia em São Paulo. Assim, essa fase acontecerá depois nas cidades da região.
Controvérsias
Apesar de ser sensível à situação econômica, Dr. Marcelo disse que não vê dúvida que se as atitudes compatíveis a ciência não forem tomadas, a mortalidade assustará. Para ele, a diferença da mortalidade no interior e em grandes centros é que nesses locais, se traduzem em números, mas em município como Varge, o impacto é maior. “Porque o cotidiano é muito próximo, por causa do tamanho da cidade, então as mortes passam a ter uma conotação muito maior do que número, porque você conhece as pessoas”, ponderou.
Isolamento social
Na opinião de médico e seguindo aquilo que a Organização Mundial da Saúde recomenda, Dr. Marcelo pontuou que a situação é muito complicada, mas que o isolamento social tem que continuar por pelo menos mais de um mês para apontar os rumos do avanço da doença. “Eu sou um democrata nato, mas eles cercaram a cidade Wuhan, que é onde surgiu, e ninguém entrava nem saia, não podiam sair de casa, o transporte público para, não sai por mais de 100 metros de casa, quem ficar doente ficava em isolamento, então em três meses resolveram”, comentou.
“Isso serve como uma experiência prática e aí você vai para as democracias. No primeiro momento no Estados Unidos, foi como no Brasil, o presidente tirou sarro da epidemia e depois se retratou publicamente quando passou a morrer muita gente”, completou.
Fake News
O médico pontuou sobre a descrença da população com um problema mundial. “Não gosto de fazer disso um ato político, mas o presidente da república esqueceu de governar esse país e começou a fazer graça com uma epidemia, sendo que nem é um problema exclusivo do Brasil, é do mundo inteiro, não dá para você desacreditar”, disse.
Ele ainda criticou quem questione a veracidade e a gravidade da doença. “Dizer que estão aumentando propositalmente o número de casos, claro que isso não é verdade, porque a Áustria vai aumentar os números? Ou a França? Ou então a Itália ou a Espanha são países subdesenvolvidos para terem o arraso que foi? Não dá para negar essa doença, então eu acho que o lance é muito em cima de tratamento e transmissão e é complicado”, completou.
Vargem
Para o médico, Vargem e cidades da região se prepararam o melhor possível dentro das possibilidades, mas que todos estão agora enfrentando certas dificuldades. Dr. Marcelo pontuou ainda que para as próximas semanas não é possível avaliar a intensidade de casos em Vargem, mas com certeza haverá um aumento, e com isso, consequentemente haverá um aumento de pessoas graves e do uso das peças hospitalares.
No entanto, o médico comentou que é esperado que as pessoas usem máscara, lavem as mãos, evitem aglomerados, para que esse aumento seja em um número que o hospital consiga suportar. Ele ressaltou que não há nenhum otimismo de que a epidemia acabe em 15 dias, mas acredita que pode ser que aconteça em uma velocidade suportável, dando tempo para que todos se recuperem.
O especialista explicou que a relação habitante e respiradores disponíveis é de primeiro mundo, mas com a epidemia toda a programação normal deixa de existir. “O Hospital daqui é ótimo, eu conheço cidades da região onde dá vontade de chorar, então ouvimos sobre dívidas, mas aqui é organizado, limpo, uniformizados e todos competentes”, avaliou.