A situação da Covid-19 em Vargem Grande do Sul chegou ao seu pior momento nesta semana. Na terça-feira, dia 25, os 14 leitos destinados ao tratamento da doença na unidade de saúde estavam todos ocupados. Havia ainda cinco vargengrandenses internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) na região. No dia seguinte, já eram 15 pacientes internados no Hospital de Caridade e quatro em UTI.
O Hospital de Caridade, que no início da pandemia em 2020 funcionava com 14 a 16 leitos para atendimentos à doença, atualmente conta com 19 vagas para atender a internação de pacientes com Covid-19, além de outros cinco leitos para os doentes que precisem de intubação. Mas, muitas vezes com menos pacientes internados, as vagas ocupadas chegam a 100%, pois quem está internado e aguardando o resultado, não pode ficar no mesmo quarto com outro paciente infectado. Se houver três pacientes com suspeita de Covid-19, tem de colocar cada um em um quarto.
A alta ocupação dos leitos, a falta de vagas em UTI na região, a quantidade de pessoas que são atendidas diariamente no Gripário, acenderam o sinal de alerta entre os dirigentes da Saúde no município. Jair Gabricho, provedor do Hospital de Caridade, que está em viagem a trabalho, enviou mensagem de áudio pedindo conscientização por parte da população. Já o prefeito Amarildo Duzi Moraes (PSDB), publicou em suas redes sociais um vídeo fazendo mais um apelo para que as medidas de prevenção sejam seguidas.
Em entrevista à Gazeta de Vargem Grande, Jair detalhou como está a situação no Hospital de Caridade no enfrentamento à doença na cidade.
Estrutura
Atualmente são 24 leitos de atendimento a pacientes com Covid-19 na unidade. Desses, 19 são destinados à enfermaria, quando o paciente está estabilizado, não precisando de intubação. Esses leitos contam com suporte respiratório para os atendidos, seja por cateter, seja por máscara. Os outros cinco leitos estão localizados na sala de recuperação pós anestésica. Em se havendo a necessidade de intubação e não se conseguindo transferir o paciente para uma UTI via Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (CROSS), o mesmo fica intubado no Hospital de Caridade, com todo suporte necessário, até conseguir vaga em UTI através do CROSS.
Questionado sobre a possibilidade de abertura de leitos extras, Jair informou que não há espaço físico dentro do hospital para ampliar essa capacidade. “E mesmo se ele fosse criado, não temos material humano para trabalhar. Tanto nosso corpo de enfermagem e corpo clínico que atuam na Covid-19, estão exaustos por mais de um ano de trabalho ininterrupto”, explicou.
“Estamos muito próximos de um colapso não só de vagas para internação, mas principalmente de profissionais da área da saúde que possam atender esses pacientes. Não existem mais no mercado esses profissionais. Todos os hospitais estão procurando”, disse.
Pacientes mais jovens e mais tempo internados
De acordo com o provedor, um paciente com Covid-19 que necessita de internação, fica em média 10 dias sob os cuidados do Hospital de Caridade. “E o tempo de permanência tem aumentado, porque a idade das pessoas internadas que era mais avançada diminuiu. Hoje são pacientes mais jovens e acabam ficando mais tempo internados. Tem todo aquele tempo de incubação e o vírus ficou mais resistente. Então o tempo de internação fatalmente deve ter aumentado”, observou Jair.
A vacinação contra a doença é uma das causas que pode ter provocado a mudança no perfil dos pacientes, uma vez que em Vargem, a imunização está indo de maneira positiva. Isso reflete nas internações. De acordo com Jair, dos 15 pacientes que estavam internados na quinta-feira, dia 26, apenas dois tinham mais de 60 anos de idade.
Ele destacou ainda que o Hospital atende não apenas os pacientes de Covid-19 que precisam de internação, mas também os que recebem atendimento ambulatorial, e que centenas de moradores já foram atendidos pela unidade de saúde desde o início da pandemia.
Profissionais exaustos e déficit de recursos
O provedor ainda foi perguntado sobre quais as principais dificuldades que o hospital tem enfrentado com relação ao combate à Covid-19. Ele elencou a exaustão da equipe em primeiro lugar e a crise financeira que a entidade atravessa, em segundo lugar.
“Se eu fosse colocar em grau de importância, a principal dificuldade seria a exaustão dos profissionais de saúde. Os médicos que lá estão atendendo insistentemente, desde o início, dando tudo de si, a equipe de enfermagem, todos os profissionais. Obviamente temos um problema seríssimo na parte financeira. Mas de uma forma ou de outra, ou com doação ou com recursos, vai trabalhando o financeiro. Agora, o fator humano já é mais difícil. A pessoa se esgota e se você não tem profissional, quem vai atender?”, questionou.
Sobre a situação financeira, Jair informou que o Governo Federal de maio para junho do ano passado liberou verbas para tratamento da Covid-19, tanto para compra de equipamentos, materiais e também para pagamento de profissionais de Saúde. “Ocorre que esse recurso se esgotou agora em janeiro e desde então, não há mais nenhum repasse por parte do governo federal no sentido de nos auxiliar financeiramente no atendimento desses pacientes. E ao mesmo tempo, o número de internações subiu exponencialmente. Aumentaram muito os casos, a demanda pelo atendimento e ao mesmo tempo, os custos subiram exorbitantemente”, explicou o provedor.
“Oxigênio, materiais e medicamentos subiram mais de 30% de fevereiro para cá. Então tivemos aumento significativo nos custos e tivemos o corte de verba para tratamento das pessoas com Covid-19. Estamos atravessando uma crise financeira gigantesca. Só conseguimos nos manter abertos, atendendo e salvando vidas, graças às doações que recebemos dos munícipes, de algumas empresas, da Associação Setembro, recursos através da Prefeitura, com autorização da Câmara municipal, esses recursos aumentaram, mas ainda são insuficientes”, relatou Jair.
Oxigênio
O Oxigênio é um dos principais produtos usados no tratamento do paciente com Covid-19. O consumo desse gás aumentou muito e o seu valor também. “O Oxigênio que nós consumimos durante o mês de maio, que começa a vencer dia 31 de maio e os outros começarão a vencer no decorrer de junho, nós não temos dinheiro para pagar. E não tendo como pagar, fatalmente a empresa para de nos fornecer. E o Oxigênio é fundamental, não tem como se tratar Covid sem, seja ele na fase ambulatorial, na internação ou na intubação”, ressaltou.
Conta não fecha
O provedor explicou ainda que somente com materiais, medicamentos e Oxigênio de cada paciente internado no Hospital, o custo varia em torno de R$ 12 mil. No entanto, o Sistema Único de Saúde (SUS) repassa apenas R$ 1,5 mil para cobrir esse valor. “Ou seja, a cada paciente atendido, há um déficit médio de R$ 10,5 mil, isso falando só de Covid-19, e contabilizando apenas materiais, medicamentos e Oxigênio. Sem falar na mão de obra, energia e os honorários médicos”, explicou Jair.
De acordo com o provedor, somente em março de 2021, o Hospital de Caridade realizou 76 atendimentos de Covid-19, via SUS e apenas oito pacientes particulares ou de planos de saúde. “São 76 pessoas que não teriam como pagar e foram atendidos via SUS. No mês de abril foram mais 63 e em maio, que ainda não fechou, calculamos que possa passar de 80 pessoas. Então o déficit é muito grande. A necessidade de recursos financeiros é enorme”, destacou.
Apelo
“Por fim, diante disso, eu queria deixar um apelo a toda população que procure tomar os devidos cuidados. Manter o distanciamento, usar máscaras, fazer a devida higienização e acreditar que é algo bastante grave. E que nós podemos chegar numa situação que não teremos como atender. Não teremos espaço, profissionais, material e medicamento. Temos que procurar proteger nossa vida e a dos demais”, observou Jair.
“O segundo apelo é que seja o munícipe, empresa, associações, qualquer pessoa que de alguma forma possa ajudar financeiramente nesse momento, para que nos auxilie e que faça sua contribuição ao hospital. Nós precisamos de recursos financeiros nesse momento. Para pagar o básico, para pagar o Oxigênio, os medicamentos que são caríssimos. Então, não importa o valor, se vier de cidadão ou empresas, que façam suas contribuições e nos ajudem financeiramente a continuar abertos e salvando vidas”, pediu o provedor.