A busca por verba para construir a 1ª Estação de Tratamento

Momento em que políticos de Vargem assinam o empréstimo para construir a primeira ETA da cidade. Fotos: A Imprensa

Teve grande repercussão na cidade e também nos meios políticos da capital as denúncias feitas pelo então jornalista e vereador Benedito Bedin no jornal Diário de S. Paulo em 1945, sobre a péssima qualidade da água consumida pelos vargengrandenses.


Para buscar maiores informações sobre a história do serviço de água da cidade, a reportagem do jornal entrou em contato com o sr. Pedro Alcântara V. Tatoni, neto do sr. Walter Tatoni, diretor do jornal A Imprensa por muitos anos, que guarda preciosa coleção do semanário e permitiu as pesquisas que ora realizamos.


Assim é que constam em uma das edições, que em janeiro de 1948, buscando solução para o problema, uma delegação formada pelo então prefeito Francisco Ribeiro Carril, pelos vereadores cap. Francisco Ribeiro Costa, presidente da Câmara, José de Oliveira Fontão, José Ribeiro de Andrade, Henrique de Brito Novaes, Nestor Bolonha, Benedito Bedin e Antero Rodrigues, seguiu para São Paulo para pleitear junto ao governador Ademar de Barros, um empréstimo para a execução das obras necessárias ao tratamento de água do município.


Foi entregue ao governador um documento onde dizia que em 6 de fevereiro de 1947, o então prefeito dr. Gabriel Mesquita encaminhou ao extinto Departamento das Municipalidades, um projeto de lei visando a obtenção de um empréstimo de Cr$ 500.000,00, baseado no decreto lei estadual nº 16.678, de 31-12-46, quantia suficiente para a conclusão das obras de abastecimento de água já iniciadas no município e atualmente paralisadas por falta de dinheiro.


Na justificativa ao empréstimo, está escrito: “o atual serviço de captação e distribuição de água já não comporta o desenvolvimento da cidade e constitui um verdadeiro flagelo, um martírio para os seus habitantes, que em determinadas épocas do ano não dispõem de água para as suas mínimas necessidades”.


Também constava do documento entregue ao governador que: “A água que abastece a cidade não é só deficiente, é, isso sim, impura, poluída, condenada, pelo fato de ser captada, sem maiores cuidados, em um pequeno córrego que atravessa vários mangueiros e chiqueiros, sendo usada em diversas fazendas para lavagem de roupa, recebendo ao longo do seu percurso, os mais perigosos detritos, num atentado verdadeiramente criminoso à saúde pública”.


Outro assunto abordado, é que a verba inicialmente pleiteada de Cr$ 500.000,00 não seria suficiente, uma vez que após estudos feitos pelo engenheiro Paulo de Paiva Castro, inspetor de Obras do extinto Departamento das Municipalidades, foi elaborado um novo orçamento, chegando à conclusão que o município necessitava de Cr$ 1.459.255,00 para a total execução das obras. Também foi informado que o município não tinha dívidas, que o orçamento vigente naquele ano era de Cr$ 450.000,00 e que a receita e a despesa vinham suplantando todas as previsões, mostrando a vitalidade do município.


Outro dado visando conseguir o empréstimo, era que a taxa de água que arrecadava Cr$ 60.000,00 por ano, poderia passar para Cr$ 100.000,00, suficiente para a amortização e juros do capital emprestado. Também foi falado que para a obtenção do empréstimo, os dirigentes políticos de Vargem se organizaram através de uma coligação de todos os partidos locais visando apoiar o governo do Estado e também centrar forças no sentido de lutar para conseguir a melhoria que a cidade mais estava precisando naquele momento, a reforma do serviço de água.


O governador Ademar de Barros recebeu todos os vargengrandenses no Palácio dos Campos Elísios às 19h30 do dia 23 de janeiro de 1948, cumprimentando um a um e ainda fez uma exclamação que todos os presentes guardaram: “Os senhores são de Vargem Grande do Sul, aquela terra que tem um magnífico lugar para um campo de aviação?”.
Quem acompanhou toda a demanda da caravana que foi até São Paulo pleitear ao governador Ademar de Barros o empréstimo, foi o deputado federal Mário Beni, grande benfeitor da cidade, que mantinha laços de parentescos com a Família Bolonha, uma vez que o então vereador Nestor Bolonha era casado com a professora Jaci Beni, irmã do deputado. Entre 1951 a 1953, Mário Beni ocupou o importante cargo de secretário da Fazenda do Governo do Estado de São Paulo e conseguiu importantes obras para Vargem Grande do Sul.


Conseguido o empréstimo de Cr$ 1.459.250,00 (Um milhão, quatrocentos e cinquenta e nove mil, duzentos e cinquenta cruzeiros) junto ao governo do Estado, a operação foi aprovada para ser paga no prazo de 40 anos, com juros de 5% e o jornal comemorava parabenizando o povo vargengrandense que depois de prontas as obras, não iriam mais beber água dos mangueirões e despejos das fazendas. Parabenizou também o prefeito e os vereadores por terem conseguidos o benefício que iria contribuir diretamente com a saúde da população.


Após saírem do palácio do governo, todos os presentes foram comemorar a vitória, sendo recepcionados na residência do deputado Mário Beni, onde também estava seu irmão Névio Beni, que passou a ser o “mestre cuca” ajudando a servir um coquetel aos vargengrandenses e depois um jantar por ele preparado. Além das animadas conversas, o cap. Ribeiro Costa e José Oliveira Fontão deram “um show” executando músicas ao piano.

O deputado estadual Mario Beni foi um dos responsáveis pela verba conseguida junto ao governador Adhemar de Barros. Foto: A Imprensa

Médicos atestam péssima qualidade da água
Para dar maior robustez às denúncias feitas na documentação sobre a qualidade da água que abastecia Vargem até o final da década de 40 do século passado, documentação esta que certamente foi levada ao conhecimento das autoridades não só de Vargem, como também do governo do Estado de São Paulo, ilustres médicos da cidade deram seu parecer técnico sobre a mesma.


Assim, no parecer do médico dr. Salvador Iélo, datado de 2 de fevereiro de 1945, assinado pelo mesmo e com firma reconhecida, sobre a pergunta se a água da rede de canalização de Vargem é potável, o médico responde que não, absolutamente. “Se é que se pode chamar água e potável ao barro e lodo que sai das torneiras”, escreveu de próprio punho. Também os médicos dr. Gabriel Mesquita, Ricardo Landini e o médico sanitarista Elbio Vaz de Camargo, que respondia pelo Posto de Assistência Médico Sanitário do município responderam que não.


A segunda pergunta respondida pelos médicos, foi se atribuíam à água de Vargem a origem de moléstias infecciosas e todos os três responderam que sim, sendo elas do aparelho digestivo e urinário. Ao serem indagados quais as doenças mais comuns atribuídas ao consumo da água sem o devido tratamento, dr. Iélo respondeu que eram as infecções do grupo coletífico, desinterias, principalmente amebianas, enterites e enterocolites, colibacilurias, dentre outras. Dr. Mesquita e dr. Landini citaram tifo e desinterias e o sanitarista dr. Elbio falou em febre tifoide e paratifoide, desinteria bacilar e amebiana.


Nas suas observações, o sanitarista ainda concluiu que o serviço de água da cidade estava rigorosamente condenado para o fim a que se destinava e requeria providências urgentes e imediatas da prefeitura local e do governo estadual, evitando grandes males para o futuro.


“As nascentes e os trajetos das mesmas até as fontes de captação não são isoladas, atravessando estábulos e eventuais saídas de esgoto de fazendas”, advertiu o médico sanitarista às autoridades municipais e estaduais.
No final da documentação está escrito: “O Serviço de Estatística desta cidade acusa a maior parte das mortes dos vargengrandenses causadas pelas moléstias referidas nos vários atestados médicos inclusos”.

 

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor insira seu comentário
Por favor insira seu nome aqui