Após acordo com MP, denúncia contra Hospital foi arquivada

A denúncia contra o Hospital de Caridade de Vargem Grande do Sul referente a casos de violência obstétrica foi arquivada pela promotora de Justiça Rebeca Barbosa Estevão, após acordo realizado entre o Ministério Público do Estado de São Paulo e o Hospital.
Os dados para a denúncia foram coletados pela jornalista e doula Eduarda de Oliveira, de Vargem. A denúncia foi resultado de anos de trabalho, onde ela reuniu casos de violência obstétrica, após usar suas redes sociais como um canal para vítimas do abuso em 2021. Na ocasião, a doula também se mostrou indignada com o impedimento da entrada de doulas no Hospital de Vargem, mesmo após a aprovação da lei, de autoria do vereador Guilherme Contini Nicolau (MDB), em agosto de 2022. Os arquivos foram enviados e a denúncia foi elaborada junto com a advogada Letícia Siquelli em 2023.
Todos os acordos firmados entre o Ministério Público e o Hospital em 20 de setembro deste ano já estão em vigor, portanto, é imprescindível que o Hospital esteja cumprindo cada um dos itens, até mesmo os que possuíam 45 dias para entrar em vigor. Caso as medidas não sejam cumpridas, as denúncias devem ser encaminhadas para o Hospital de Caridade, através de ouvidoria para apuração. A Gazeta de Vargem Grande tentou contatar o Hospital de Caridade para saber qual o e-mail e telefone de contato da ouvidoria. No entanto, até o fechamento desta edição, não obteve retorno.
As denúncias também podem ser encaminhadas para Eduarda de Oliveira, através do telefone (19) 97153-7714, com o objetivo de que as informações cheguem aos órgãos competentes.
Para o acordo, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta, que tem como objetivo estabelecer medidas para atendimento humanizado a parturientes, puérperas e recém-nascidos e prevenir violência obstétrica nos seus atendimentos, nos termos das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), do Ministério da Saúde, da Convenção da CEDAW, que debateu e reuniu práticas para a eliminação de todo tipo de discriminação contra a mulher, em 1979; Convenção de Belém do Pará, que debateu e reuniu práticas para a erradicação da violência obstétrica, em 1994; da Lei Estadual n. 17.803/23, que assegura às mulheres o direito a acompanhante durante as consultas médicas, exames e demais procedimentos clínicos nos estabelecimentos de saúde públicos e privados do Estado de São Paulo; da Lei Estadual n. 17.431/2021, que consolida as leis da proteção e defesa da mulher; e da Lei Municipal n. 4.724/22, que garante o acesso de doulas aos estabelecimentos de saúde públicos ou privados, em Vargem Grande do Sul.
Na ocasião, o Hospital se comprometeu a assegurar atendimento digno e humanizado e, assim, não praticar atos de violência obstétrica, adequando seus procedimentos as recomendações, elaborando em até 45 dias material por escrito contendo os direitos das parturientes, puérperas e recém-nascidos, para distribuição aos profissionais que trabalhem na obstetrícia, além de disponibilizar equipes capacitadas para atendimento de parturientes, puérperas e recém-nascidos.
Ficou também acordado que a equipe médica obstétrica e de enfermagem que se dirijam a elas pelo nome, vedando-se a utilização de apelidos, de expressões preconceituosas, tratamento vexatório, grosseiro, discriminatório ou desrespeitoso, inclusive em razão de sua cor, etnia, raça, religião, estado civil orientação sexual ou número de filhos.
O Hospital deveria, também, informar as orientações à equipe médica com ampla publicidade em até 30 dias. Ficou acordado também que é preciso respeitar a presença do acompanhante da paciente em todos os momentos, registrando com assinatura do mesmo quando se recusar a entrar, de acordo com a Lei Federal nº 14.737/2023.
É necessário ainda cumprir a Lei Municipal n. 4.724/22, que permite a presença de doula, registrando a presença e também o motivo que justifique a sua retirada do local.
Em até 30 dias, o Hospital deveria orientar, por escrito, a equipe médica e de enfermagem a garantir efetiva comunicação entre agentes de saúde e a paciente, para usarem linguagem acessível e explicarem sobre os procedimentos, tratamentos e medicamentos ministrados, buscando o consentimento informado da paciente, como exame de toque, uso de colírio em recém-nascido, entre outros, exceto em risco iminente de vida.
O Hospital acordou em oferecer analgesia epidural ou outros tratamentos e técnicas para alívio das dores do parto, seja cesárea, seja parto normal, por meio de médico anestesista, atendimento de doula e de enfermeiras obstetras, conforme o caso. É necessário ainda oferecer ingestão de líquidos e alimentos a parturientes, exceto em casos que possam colocar em risco a saúde da paciente ou do recém-nascido, o que deve ser justificado no prontuário.
Segundo o documento, é preciso garantir a mobilidade da paciente e escolha do posicionamento mais confortável durante o parto, onde exceções deverão ser justificadas no prontuário, de maneira clara e legível. É preciso, também, evitar uso rotineiro e indiscriminado de episiotomia, o conhecido ‘pique’, com a autorização da paciente e justificativa médica no prontuário, nos casos em que houver essa indicação médica.
Fica proibido a utilização da manobra de Kristeller (empurrar a barriga durante a saída do bebê). O Hospital deve manter os prontuários médicos conforme as resoluções exigidas e, em 30 dias, deveria assegurar a abertura do partograma para todas as puérperas, bem como, assegurar que a assistência a gestantes, parturientes e puérperas seja prestada por médicos obstetras.
O Hospital ainda precisa garantir contato pele a pele do recém-nascido sem complicações durante a primeira hora após o parto, para prevenção de hipotermia e promover aleitamento materno. Conforme o acordo, em caso de necessidade de procedimento diverso, é preciso justificar expressamente em prontuário a não observação da regra, informando a parturiente/acompanhante o motivo.
Não é permitido o ingresso de “estagiários” ou qualquer tipo de estudantes e pessoas que não façam parte da equipe que atende a gestante e parturiente, sem consentimento expresso e por escrito da paciente.
É preciso, ainda, tomar medidas para manter tratamento humanizado a pacientes em caso de aborto ou natimorto, informando em local mais reservado à família, respeitando a opção da família por ver ou não o natimorto, mantendo a genitora em quarto sozinha, sem outras mães e bebês, com maior privacidade.
Era preciso que o Hospital mantivesse um canal, sendo e-mail e telefone próprio, para que seja informado sobre eventuais descumprimentos, a fim de apurar devidamente e registrar formalmente o encaminhamento dado à reclamação.
Todas as obrigações assumidas pelo Hospital, tanto as que não possuem prazo e também as que possuem prazo de 30 ou 45 dias, já devem estar sendo cumpridas, uma vez que o acordo foi assinado no dia 20 de setembro.
Ficou acordado que o Hospital precisaria comunicar a Promotoria de Justiça por ofício sobre o avanço das medidas. O descumprimento injustificado dos prazos fixados importará em multa de R$ 1.000,00 por dia de atraso, destinada ao Fundo Estadual de Reparação dos Interesses Difusos, nos termos do artigo 13 da lei no 7.347/85.
O Hospital ainda precisaria dar publicidade ao termo em seu site e também das redes sociais em até 10 dias após a homologação pelo Conselho Superior do Ministério Público, encaminhando cópia da publicação ao Ministério Público.
O termo foi assinado pela promotora de Justiça Rebeca Barbosa Estevão, pelo interventor do Hospital José Geraldo Ramazotti, pelo procurador Antônio Carlos do Patrocínio Rodrigues, pelo administrador Francisco de Assis Masuco Manoel, pela enfermeira responsável técnica Maria Helena Zan e pelo enfermeiro Paulo Sérgio Cremasco Ramos.

Inquérito foi arquivado
O inquérito civil foi instaurado por portaria de 21 de setembro de 2023, visando apurar ocorrência de violência obstétrica no Hospital de Caridade de Vargem Grande do Sul e de medidas preventivas a essa prática. Foi iniciado após representação das pacientes do Hospital Eduarda de Oliveira, Adriele Eduarda da Silva, Isabele Cristine Felippe, Juliana Leal Freire da Silva e Ligia Fernandes Perroni Venezian.
Durante as diligências preliminares e a tramitação do inquérito civil, foram ouvidas as pacientes Eduarda Oliveira, Taina Marques Salgueirosa Souza, Oliveira e Isabele Cristine Felippe.
Foram também ouvidas testemunhas Alexandra Salgueirosa (acompanhante e mãe de Tainá), Samanta Cristina Morale (acompanhante e irmã de Tainá), e Gabriel Frigini (acompanhante e esposo de Eduarda).
De acordo com o documento, foram realizadas reuniões com o Hospital, sendo propostas medidas para prevenir a prática de violência obstétrica, que foram negociadas em 26 de janeiro deste ano e 19 de abril deste ano, com participação de dirigentes administrativos e responsáveis técnicos do Hospital, até assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta em 20 de setembro deste ano.
Segundo o informado, mesmo sem estar vigente o Termo, o Hospital havia demonstrado que disponibilizou meios para registro de doulas e a criação de canal para recebimento de reclamações, sem prejuízo do acompanhamento dessas medidas e das demais cláusulas após sua homologação.
A Promotoria de Justiça informou que entende-se que as cláusulas adotadas são suficientes para sanar irregularidades e prevenir a repetição de episódios de violência obstétrica. Assim, o inquérito civil foi arquivado no dia 23 de setembro.

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