Consciência Negra: palestras, batalha de rima e técnica trancista marcarão evento

A trancista Mariane busca evidenciar a cultura e elevar a autoestima nas tranças das clientes. Fotos: Arquivo Pessoal

Fotos: Arquivo Pessoal

Com uma série de atividades na Represa Eduíno Sbardellini no domingo da próxima semana, dia 20, a importância do negro para a construção da sociedade brasileira e para Vargem Grande do Sul será celebrada. O Departamento de Cultura e Turismo da prefeitura de Vargem Grande do Sul irá oferecer uma programação com muitas ações para marcar o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro.
As festividades acontecerão juntamente com a terceira edição da Feira Gastronômica, que contará com 24 espaços, incluindo comida baiana e o Espaço Beleza Negra, com técnica trancista e maquiagem para a pele negra, rodas de capoeiras e exposição das escolas da cidade com o tema “Cultura Negra”.
O evento contará com a apresentação da escola Nair Bolonha às 11h. Na sequência, haverá a exibição do Grupo de Maracatu Vale do Sol, de São José do Rio Pardo, às 11h30. A programação conta também com Batalha de Rimas às 13h, seguida pela roda de samba do grupo Entre Amigos, às 13h30. As atrações musicais se encerrarão com a apresentação da Escola de Samba Vai-Vai, do grupo especial de São Paulo, com porta-bandeira, mestre sala e passistas, a partir das 16h.

Sander é psicólogo e pontuou que o orgulho em ser negro precisa ser trazido à tona

Representatividade
A cabeleireira e trancista Mariane de Lima Rosa, de 31 anos, está na profissão há 15 anos e marcará presença no evento. Na adolescência, Mariane já estava na área e fazia atendimento no quintal da sua casa. À Gazeta de Vargem Grande, ela contou como será a sua participação na comemoração ao Dia da Consciência Negra na represa.
“No evento trarei novidades, apresentação de materiais usados em nosso trabalho, acessórios utilizados na cultura negra, atendimento ao cliente em tempo real, mostrar um pouco da história através do nosso trabalho, também incluindo as novidades. Hoje em dia as tranças estão em alta, é um estilo diferenciado, que está fazendo a diferença na vida da nossa negritude, e deixando com estilo inovador através da nossa representatividade cultural”, explicou.
A profissional pontuou que a importância desse evento para a cidade é mostrar que aos poucos, a cultura está ganhando espaço e sendo reconhecida. “Sinto que com este evento a moral da cultura negra está se fortalecendo, vejo que através desse movimento cultural, a autoestima do povo preto será reerguida novamente. Vidas negras importam, a autoestima importa e o respeito é essencial para mostrar que a beleza negra, além de linda, tem história, representatividade, força e luta”, disse.
“Esse evento é tão importante para nossa maioria, que ainda é minoria em questão de espaço, voz e cultura, que traz ao nosso povo preto periférico que estamos sendo reconhecidos de alguma forma”, completou.
Mariane ressaltou que cada pessoa, independentemente da cor, crença e credo, merece ser respeitada. “Nossa história negra está cheia de luta, merecemos sorrir, merecemos respeito e nosso espaço tem que ser reconhecido. Todas as vidas importam, não podemos deixar nossa voz se calar, todos merecemos sentir bem e meu trabalho é para ver esses sorrisos, para elevar autoestima, deixar nosso estilo em evidência, nossa cultura e nosso costume. Nossa história é forte, somos a resistência e seguimos o lema 4P: poder para o povo preto”, finalizou.

Orgulho
O psicólogo Aleksander Wellington da Silva, conhecido como Sander, fará palestras ligadas aos direitos civis da população preta e periférica e auxiliará a diretora do Departamento de Cultura, Márcia Iared, durante o evento na represa.
Formado há mais de 10 anos, ele atua na área de saúde mental e social há mais de 20 anos, incluindo desde atenção voltada a grupos de apoio ligados à dependência química, que atua ativamente, mas também no trabalho social quanto a questão do adolescente, já que muitas vezes participa de trabalhos em escolas públicas com diversos temas, como drogas, a violência e consciência social.
Ele contou que entrou na área quando ainda era garoto. “Aos 17 anos, quando optei por essa área, mesmo sem saber ao certo do que se tratava, era de alguma forma gerar auxílio e conscientização. Além da saúde mental, e o trabalho clínico que mantenho de modo assíduo, a questão social é algo de suma importância em minha vida. Penso que sem essa consciência, nós, enquanto sociedade, não caminharemos com equidade e essa inquietação sempre foi o maior fator interno, já que toda e qualquer ação gera um reflexo social”, pontuou.
Sander comentou sobre a importância da festividade da Consciência Negra. “Esse evento que privilegia a atenção à população negra, favorece sempre a conscientização e isso é fundamental para o fortalecimento social. É importante compreender que há poucos anos vivíamos uma escravatura, quem colaborou para o poço de desigualdade que vemos a olho nu, que grande parte dos avanços sociais se deu em função da escravidão de uma população sobre outra”, ressaltou.
“Isso é recente, não pode ser esquecido, portanto, além desses pontos, o orgulho em ser negro precisa ser trazido à tona, a valorização da cultura, que engloba música, costumes, religião, precisa ativamente de fortalecimento e esses encontros são enriquecedores nesse sentido”, informou.

Para o grafiteiro e rapper DR, nascer negro é consequência, ser preto é consciência

Igualdade
Diego Roberto Bernardes, conhecido como DR, tem 38 anos e é grafiteiro e rapper. Ele fará apresentação de rap no evento, sendo o responsável pela Batalha de Rima, que será das 10h às 11h.
Ao jornal, ele contou que a Batalha de Rima terá uma eliminatória, pois muitos MCs querem participar e apenas uma hora não será o suficiente para todos. Assim, haverá uma eliminatória na Praça Capitão João Pinto Fontão, a Praça da Matriz, na sexta-feira, dia 18. Na ocasião, serão selecionados os MCs que vão participar no domingo, dia 20.
Para o evento, DR também renovará os grafites da represa com o tema Consciência Negra. Além disso, às 13h, Diego se apresentará no evento, cantando algumas músicas.
Ele contou que a cultura sempre o abraçou de volta, possibilitando que ele se expressasse. “Já tem uns 20 anos que eu desenvolvo esse trabalho com a música, com arte e com graffiti, é desde os anos 2000. O que me motivou a entrar nesse movimento, na cultura hip hop, é por ela ser uma cultura que não faz acepção de pessoas, tanto faz você ser negro ou branco, pode ser qualquer tipo de pessoa, homem ou mulher, etc.”, disse.
“É uma cultura que abraça a todos e dá espaço para todos exporem sua arte, seu pensamento e seu movimento, seja na dança, no grafite, na poesia do rap ou na discotecagem do DJ. Então essa é uma cultura que sempre me abraçou, eu me senti muito acolhido e consegui me expressar com essa cultura. Consegui através do rap mostrar meus pensamentos, a forma que eu vejo o mundo e as coisas ao meu redor”, completou.
DR pontuou a importância desse evento para a comunidade negra e para a cidade. “Há tempos não víamos um evento assim comemorativo no Dia da Consciência Negra, então, acho que será um marco para a cidade. E é um evento não só para curtirmos, mas para relembrarmos a morte de Zumbi dos Palmares e pensar que a história não acabou ali na Serra da Barriga, onde Zumbi dos Palmares foi morto. A história ainda se repete, ainda tentamos lutar pela liberdade, pelo direito de ir e vir, de igualdade, e vemos a situação que está ainda o preconceito, o racismo que existe no mundo, no Brasil e a cada dia vem se revelando”, refletiu.
DR ressaltou sobre a importância da cultura hip hop. “É uma cultura que foi criada nos guetos americanos, formado com sua maioria de adeptos negros, mas sempre foi um movimento que lutou a favor dos direitos civis e da igualdade social. E, hoje, é uma cultura que se estende no mundo todo e sem acepção de pessoas. Queria deixar uma frase de uma das minhas músicas que escrevi: nascer negro é consequência, ser preto é consciência”, finalizou.

Dia da Consciência Negra
O Dia Nacional da Consciência Negra, comemorado no dia 20 de novembro em todo o país, faz menção à morte de Zumbi em 1695, o líder do Quilombo dos Palmares, situado na Região Nordeste do Brasil, entre Alagoas e Pernambuco. Zumbi se tornou símbolo da luta dos negros escravizados no Brasil por seus direitos.
A data foi instituída oficialmente em 2011 e relembra a luta dos africanos escravizados no passado e destaca a importância de tornar a sociedade brasileira mais justa.
Em Vargem Grande do Sul, ao contrário de muitos municípios, a data não se trata de feriado municipal, mas é celebrada dentro do Calendário de Eventos municipais com a Semana da Consciência Negra, desde 2009, após um projeto de lei de iniciativa do vereador Wilsinho Fermoselli (DEM), aprovado por unanimidade pela Câmara Municipal, receber a sanção do prefeito Amarildo Duzi Moraes (PSDB), em seu primeiro mandato.

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